domingo, 3 de junho de 2012

O amor, tão nobre



O amor, tão nobre, tão denso, tão intenso, acaba. Rasga a gente por dentro, faz um corte profundo que vai do peito até a virilha, o calor acaba e só resta o frio, o amor se encerra bruscamente porque de repente uma terceira pessoa surgiu ou simplesmente porque não há mais interesse ou atração, sei lá, vá saber o que interrompe um sentimento, é mistério indecifrável. Mas o amor termina mal-agradecido, termina, e termina só de um lado, nunca se encerra em dois corações ao mesmo tempo, desacelera um antes do outro, e vai um pouco de dor pra cada canto. Dói em quem tomou a iniciativa de romper, porque romper não é fácil, quebrar rotinas é sempre traumático."

(Martha Medeiros)

Acreditamos


Acreditamos que grandes amigos são apenas aqueles que estarão ali pra nos ajudar a enfrentar os maus momentos, as dificuldades, as decepções. São sim importantes amigos que nos levantam, nos dão força e nos apoiam, mas não é apenas isso que determinará a qualidade de nossos amigos.
Não foram apenas nas dificuldades onde descobri os meus amigos.
Foram nas alegrias, nos silêncios, nos conselhos,nas brincadeiras, nas risadas, nos segredos, em brigas, em zangas, reconciliações.
Descobrimos os amigos em detalhes, em sinais, em conversas, em abraços, em saídas, em saudades, em olhares.
Cada dia de vivência, é uma nova descoberta.
Descobrimos amigos pela presença, mas acima de tudo pela ausência.
Amigos mesmo descobrimos pelo que eles pensam de nós assim que nos fazemos ausentes.
Amigo é aquele que mesmo longe mantém tudo que disse diante de você.
O amor que ele declara na sua frente, é o mesmo amor que ele continua afirmando quando você se vai embora.

Imelda Sitole

MULHERÃO


MULHERÃO 
“Mulherão é aquela que pega dois ônibus por dia para ir ao trabalho e mais dois para voltar, e quando chega em casa encontra um tanque lotado de roupa e uma família morta de fome. Mulherão é aquela que vai de madrugada para a fila garantir matricula na escola e aquela aposentada que passa horas em pé na fila do banco para buscar uma pensão de 100 Reais. Mulherão é a empresária que administra dezenas de funcionários de segunda a sexta, e uma família todos os dias da semana. Mulherão é quem volta do supermercado segurando várias sacolas depois de ter pesquisado preços e feito malabarismo com o orçamento. Mulherão é aquela que se depila, que passa cremes, que se maquia, que faz dieta, que malha, que usa salto alto, meia-calça, ajeita o cabelo e se perfuma, mesmo sem nenhum convite para ser capa de revista. Mulherão é quem leva os filhos na escola, busca os filhos na escola, leva os filhos para a natação, busca os filhos na natação, leva os filhos para a cama, conta histórias, dá um beijo e apaga a luz. Mulherão é aquela mãe de adolescente que não dorme enquanto ele não chega, e que de manhã bem cedo já está de pé, esquentando o leite. Mulherão é quem leciona em troca de um salário mínimo, é quem faz serviços voluntários, é quem colhe uva, é quem opera pacientes, é quem lava roupa pra fora, é quem bota a mesa, cozinha o feijão e à tarde trabalha atrás de um balcão. Mulherão é quem cria filh
os sozinha, quem dá expediente de oito horas e enfrenta menopausa, TPM, menstruação. Mulherão é quem arruma os armários, coloca flores nos vasos, fecha a cortina para o sol não desbotar os móveis, mantém a geladeira cheia e os cinzeiros vazios. Mulherão é quem sabe onde cada coisa está, o que cada filho sente e qual o melhor remédio pra azia… 
Mulherão é quem mata um leão por dia!”

Já fomos mais silenciosas.


“Já fomos mais silenciosas. Mas, ao ganhar o direito à voz, nos tornamos mulheres aflitas, que não se permitem um momento de quietude. Falamos, falamos, falamos compulsivamente, como se fosse contra-indicado guardar-se um pouco, como se o silêncio pudesse nos inchar. Já sofremos com mais pudor. Hoje nossas deprês são extravasadas, distribuídas, ofertadas, viram capa de revista, como se a dor fosse uma inimiga a ser despejada, como se o sofrimento fosse algo venenoso e necessitasse de expulsão, como se não valesse a pena alimentar-se dele e através dele crescer. Já fomos mães mais atentas, que geravam por mais tempo, por bem mais do que nove meses. Levávamos os filhos dentro de nossas vidas por longos anos. Hoje temos mais pressa em entregá-los para o mundo, a responsabilidade pesa, e como peso é tudo o que não queremos, acabamos por nos aliviar dos compromissos severos de toda educação. Já fomos mais românticas. Hoje o sexo é mais importante, queima calorias, melhora a pele e não duvido que um coração vazio também ajude na hora de subir na balança. Por um lado, conquistamos tanto, e, por outro, estamos nos esvaziando, querendo tudo rápido demais e abrindo mão de aproveitar o que a vida tem de melhor: o sabor, o gosto. Calma, meninas. Amor não engorda. Discrição não engorda. Reflexão não engorda. Não é preciso se agitar tanto, correr tanto, falar tanto, brigar tanto, nada disso é exercício aeróbico, é apenas tensão. Nesse ritmo, perderemos a beleza da feminilidade e acabaremos secas não só por fora, mas por dentro também.”

De criança, médico e louco,


De criança, médico e louco, todos temos um pouco.
Amadureça, mas não perca a sua criança interior.
A criança que ainda acredita em sonhos, em dias melhores, que acredita na verdade e nos sentimentos que as pessoas carregam.
A criança que sorri de alma aberta, que ri alto , que contagia os outros com a sua alegria .
A criança que é sincera nos seus sentimentos, nos seus pensamentos.
A criança que dançaria na chuva, que não pensaria no amanhã, a crianca que não se importa com a opinião dos outros.
O mundo quer que cresçamos rapidamente, e deixemos pra trás esse lado belo da vida, mas guarde consigo essa criança, a criança que gosta de coisas simples, que agradece os pequenos gestos, e que adora dar abraços.
Não importa quantos números tem a nossa idade, importa mesmo 
que até o fim de nossos dias, tenhamos o mesmo coracão, a mesma pureza daquela criança que fomos, e que sempre seremos .

Imelda Sitole

“Pessoas com vidas interessantes não tem fricote.


“Pessoas com vidas interessantes não tem fricote. Elas trocam de cidade, investem em projetos sem garantia, interessam-se por gente que é o oposto delas, pedem demissão sem ter outro emprego em vista…
Aceitam um convite para fazer o que nunca fizeram. Estão dispostas a mudar de cor preferida, de prato predileto. Começam do zero inúmeras vezes. Não se assustam com a passagem do tempo. Sobem no palco, tosam o cabelo, fazem loucuras por amor, compram passagens só de ida.”

Todos temos um amor mal resolvido


Todos temos um amor mal resolvido, uma saudade que não passa, um desejo dificíl de ser explicado, muito mais dificíl de ser entendido.
Todos nós temos um amor mal resolvido, que foi embora sem o nosso consentimento, que se acabou antes do tempo, que se fez ausente, mas permaneceu na cabeça.
Todos temos um abraço que marcou o corpo, marcou a alma, uma música que resume a história da nossa vida, um cheiro, um lugar que nos lembra alguém.
E no fundo todos nós temos aquela história que nos acompanha em cada suspiro e que gostariamos de esquecer, ou voltar pra fazer diferente.

Imelda Sitole

Ele ficou de ligar


"Ele ficou de ligar às duas da tarde. Às duas em ponto você estava plantada ao lado do telefone. Às duas em ponto o telefone não tocou. Nem às duas e quinze. Nem às duas e meia. Nem às três. Você liga pra ele e lhe comunicam que ele não está. Ninguém sabe onde ele está. Quatro e meia. O telefone numa quietude petulante.
A imaginação, então, começa aquele exercício macabro de formular suposições. Onde ele está, afinal?
1. Ele está em casa, quietinho. Não ligou de propósito. Não atendeu o telefone de propósito. Ele quer que eu me dê conta sozinha de que a história acabou. Ele não tem coragem de terminar olhando nos meus olhos. Prefere que eu fique com raiva dele, assim me conformo mais rápido. No fundo, ele está se achando muito bonzinho, aquele pulha.
2. Ele não ligou porque ficou chateado com o que eu fiz ontem. Foi isso. Mas que diabo fiz ontem? Nós não brigamos. Não nos xingamos. Não falei mal da mãe dele. Nem da camisa puída dele. Nem do timeco dele. Ficamos o tempo todo no maior amasso. Eu fiz tudo certo, cacilda.
3. Ele conheceu outra depois que saiu aqui de casa. Ele passou num bar para tomar a saideira e viu a garota encostada no balcão. Chegou nela. Falaram. Ficaram. Sairam juntos. Estão juntos até agora, cinco e vinte da tarde. Eu quero morrer.
4. Morrer? Foi isso! Ele saiu daqui levitando de paixão, atravessou a rua sem olhar para os lados e cataplum! Passaram por cima. No tombo, perdeu a carteira de identidade. Foi levado para o IML. Não o identificaram. Foi enterrado como indigente numa vala comum. Impossível telefonar de lá.
5. Ele não morreu. Foi atropelado, mas não morreu, só ficou com uns lapsos de memória. Esqueceu meu número. Esqueceu meu endereço. Esqueceu que existe guia telefônico. E também não sabe mais ver as horas.
6. Ele ligou. Ele ligou pontualmente às duas, como estava combinado, mas eu não ouvi. Que silêncio é esse? Estou surda. Socorro, estou surda.
Você está louca, isso sim. Basta falhar a combinação e você já fica variando, criando mil fantasias na cabeça. Você e a torcida do Flamengo. Por que ficamos tão enlouquecidos com a desinformação? Por que estamos sempre achando que vamos ser deixados de uma hora pra outra? Por que acreditamos tão pouco em contratempos e ficamos a imaginar o pior? Simples: porque estamos apaixonados. Acontece com as melhores cabeças."

(Martha Medeiros )